
A vida de um motoqueiro transformado em assaltante de bancos cruza com a de um policial honesto que se vê rodeado pela corrupção no departamento em que trabalha.
Crítica:
O Lugar Onde Tudo Termina tem sido alardeado como um dos filmes mais ambiciosos do ano. Dirigido por Derek Cianfrance, o mesmo do excelente Namorados para Sempre, o drama épico dividido em três atos é, de fato, um projeto que almeja grandes coisas, e dá pra sentir isso subjacente nas duas horas e vinte minutos de história. O problema é que o filme não leva adiante as questões que parece levantar e não desenvolve o suficiente certos elementos do enredo, e quando finalmente chegamos ao tal lugar onde tudo termina, a pergunta que fica é o que exatamente foi esse “tudo”.
Ryan Gosling é Luke, um dublê motoqueiro coberto de tatuagens e com uma tintura loira vagabunda no cabelo que ganha a vida se apresentando no globo da morte de um circo. Certa noite, após uma apresentação, ele encontra Romina (Eva Mendes), uma garota com quem ele teve um rápido caso um ano atrás, durante a passagem anterior do circo pela cidade. Ele descobre que ela acabou engravidando e tendo um filho dele, e que agora ela e sua família estão sendo sustentadas por seu atual noivo, Kofi. Mesmo assim Luke decide que deve, a qualquer custo, fazer parte da vida do filho que há poucos minutos nem imaginava existir, e para isso abandona sua única fonte de renda pra arriscar um emprego melhor e ficar na cidade.
Como estamos num universo white trash, não é nenhuma surpresa quando um cara de pouca instrução como Luke tem como melhor opção um serviço de ajudante numa oficina mecânica de fundo de quintal. Mas não demora pro seu patrão com mais experiência de vida sugerir um meio mais rápido de conseguir dinheiro: assaltar bancos. É prático e seguro, basta fazer tudo direito! Luke e Robin, o patrão, começam então a executar os assaltos, e o negócio caminha bem por um tempo. Enquanto isso, Luke começa a comprar presentes pro filho Jason e passar mais tempo perto dele e de Romina. Num passeio dos três, ele realiza o seu desejo de testemunhar o momento em que Jason prova sorvete pela primeira vez, para poder se lembrar do rosto dele cada vez que tomar sorvete dali em diante. A cena em que os três tiram uma foto juntos (que será exibida várias vezes no decorrer do filme) é bastante comovente. Infelizmente, a felicidade dura pouco e Luke acaba sendo preso por agredir o noivo de Romina durante uma discussão.
<spoilers>
Robin paga a fiança e Luke é liberado, já determinado a retomar os assaltos. Só que Robin recua e diz que não vai mais ajudá-lo, então ele compra uma moto nova depois que a sua é destruída por seu patrão e resolve agir sozinho. Dessa vez, as coisas não saem tão bem e durante a fuga ele é perseguido por carros da polícia. Bradley Cooper aparece todo jovial e de barba feita como o policial que o encurrala numa casa. Os dois trocam tiros e Luke morre ao cair da janela do andar de cima. Fim do primeiro ato.
No segundo ato somos introduzidos a Avery, o policial interpretado por Cooper, que se encontra no hospital recuperando-se do ferimento que sofreu na troca de tiros. Ele é interrogado por um detetive sobre como exatamente se deu a morte de Luke, e acaba mentindo ao afirmar que Luke atirou primeiro. Mas Avery é um bom moço e passa a ser atormentado por um sentimento de culpa, principalmente depois que descobre que Luke tinha, assim como ele, um filho de um ano. Mesmo festejado como herói por seus colegas de trabalho, ele mal consegue disfarçar a aflição que está sentindo.
Ray Liotta então aparece como um policial corrupto e ameaçador que resolve levar Avery até a casa de Romina, que é vasculhada até o dinheiro de um dos assaltos de Luke ser encontrado sob o colchão do berço de Jason (que chega a ser carregado no colo por Avery). Depois, Avery arrisca pedir uma promoção bastante ambiciosa ao seu chefe, mas acaba tendo seu pedido negado e, por conta de sua perna ferida, acaba servindo como vigilante na sala de evidências. Se sentindo mal pela situação na casa de Romina, ele tenta devolver o dinheiro a ela, que não aceita. Então ele tenta dar o dinheiro ao seu chefe, como qualquer policial honesto faria, mas o chefe está longe de ser um poço de integridade e conta tudo a Liotta.
Liotta, mais ameaçador do que nunca, pede que Avery o siga de carro até um local remoto, e no trajeto percebemos que se trata do lugar mencionado no título original do filme, o lugar atrás dos pinheiros. A sequência é de uma tensão crescente, e vai ficando cada vez mais escuro à medida que Avery se aproxima do destino. Pressentindo que algo ruim vai acontecer, ele entra em pânico e recua, arrancando à toda velocidade. Ele guarda o dinheiro na caixa do caso de Luke, onde encontra a foto tirada no passeio do sorvete, e depois arma um esquema para enquadrar o grupo de policiais corruptos liderados por Liotta. Sem encontrar grandes empecilhos, ele consegue juntar as provas necessárias e derrubar o grupo, virando mais uma vez herói nacional. E você sente que nesse ponto o filme deveria amarrar as pontas e chegar a uma conclusão, mas não: ainda faltam 50 MINUTOS.
Chegamos finalmente ao terceiro ato, que é o que supostamente deveria trazer o statement que o filme parece tanto querer fazer. Passam-se quinze anos, e Avery agora é candidato a procurador-geral. Nenhum truque foi usado pra fazer Bradley Cooper parecer mais velho, e até seus cabelos brancos na nuca continuam os mesmos de quinze anos atrás, quando o personagem deveria estar ainda na casa dos vinte. Rose Byrne, que interpreta a esposa (agora ex), também não muda nada. Mas o foco mesmo aqui é o irritante AJ, o filho de Avery, que é interpretado por Emory Cohen. Ele chega pra morar com o pai, e fica logo claro que os dois têm uma relação difícil. AJ é o típico filhinho-de-papai mimado que acha que pode tudo, e ao chegar na nova escola, adivinha quem é a primeira pessoa com quem ele faz amizade... JASON! Sim, o filho de Luke. Bem inexplicavelmente, porque os dois não têm absolutamente nada a ver.
Mesmo assim, AJ e Jason começam a andar juntos, e chega a ser quase inevitável imaginar que existe alguma tensão sexual entre os dois. Do mesmo nada que surge a improvável amizade, surge também um carro da polícia pra prender os dois por posse de drogas, e aí você tem certeza que o filme está esgotado de ideias no que diz respeito à verossimilhança dos acontecimentos. Mas enfim, o que importa é que agora os personagens todos se encontram e descobrem quem é quem. Jason descobre que o pai de AJ foi o responsável pela morte de seu pai, e a coisa toda culmina com ele apontando uma arma pra Avery no mesmo lugar lá atrás dos pinheiros. O que vem a seguir não é muito emocionante.
</spoilers>
Uma pena. O filme constrói lentamente algo que parece ir numa direção, mas acaba indo em outra e no final não chega a lugar algum. Os dois primeiros atos são bastante envolventes e pacientemente desenvolvidos, e há toda uma atenção especial dedicada aos pequenos detalhes e conexões entre as histórias. Sem falar das excelentes atuações de Ryan Gosling e Bradley Cooper. Mas quando chegamos ao último terço, a coisa se perde e fica absurdamente arrastada, e no fim das contas eu não consegui captar qual foi a grande mensagem. “Não podemos fugir do nosso destino”? “Você colhe o que planta”? “O ser humano é naturalmente corrupto”? “Use camisinha”? Façam suas apostas. Mas seja lá qual for essa tal mensagem, o tempo total gasto pra se chegar nela é infinitamente menos proveitoso que somente os primeiros 50 minutos do filme, por exemplo, que pelo menos conseguem divertir e prender a atenção sem maiores compromissos.
Não que não dê pra tirar alguma coisa do filme como um todo. Há sim conexões entre as histórias, e é possível fazer algumas observações interessantes acerca dos personagens. Por exemplo, Avery passou tantos anos sendo consumido por um sentimento de culpa em relação ao estrago que causou na família de outra pessoa que se esqueceu de prestar atenção à sua própria, algo que é refletido no relacionamento distante e difícil que tem com AJ. Ele também subiu na vida denunciando a corrupção dos outros, sendo que na verdade foi sua própria corrupção ao mentir que acabou desencadeando todos os seus problemas. São pontos válidos. Por outro lado, o filme investe em outros pontos que parecem não ter a menor relevância, e às vezes nenhum sentido, como a amizade entre AJ e Jason. E o mais problemático em relação a esse ponto específico é que ele é claramente um mecanismo pra se chegar a uma conclusão supostamente inescapável e obrigatória, e no fim acaba não tendo função alguma quando a conclusão não se mostra nem uma coisa nem outra. E o lugar onde tudo termina acaba se tornando o lugar onde nada acontece.
Ryan Gosling é Luke, um dublê motoqueiro coberto de tatuagens e com uma tintura loira vagabunda no cabelo que ganha a vida se apresentando no globo da morte de um circo. Certa noite, após uma apresentação, ele encontra Romina (Eva Mendes), uma garota com quem ele teve um rápido caso um ano atrás, durante a passagem anterior do circo pela cidade. Ele descobre que ela acabou engravidando e tendo um filho dele, e que agora ela e sua família estão sendo sustentadas por seu atual noivo, Kofi. Mesmo assim Luke decide que deve, a qualquer custo, fazer parte da vida do filho que há poucos minutos nem imaginava existir, e para isso abandona sua única fonte de renda pra arriscar um emprego melhor e ficar na cidade.
Como estamos num universo white trash, não é nenhuma surpresa quando um cara de pouca instrução como Luke tem como melhor opção um serviço de ajudante numa oficina mecânica de fundo de quintal. Mas não demora pro seu patrão com mais experiência de vida sugerir um meio mais rápido de conseguir dinheiro: assaltar bancos. É prático e seguro, basta fazer tudo direito! Luke e Robin, o patrão, começam então a executar os assaltos, e o negócio caminha bem por um tempo. Enquanto isso, Luke começa a comprar presentes pro filho Jason e passar mais tempo perto dele e de Romina. Num passeio dos três, ele realiza o seu desejo de testemunhar o momento em que Jason prova sorvete pela primeira vez, para poder se lembrar do rosto dele cada vez que tomar sorvete dali em diante. A cena em que os três tiram uma foto juntos (que será exibida várias vezes no decorrer do filme) é bastante comovente. Infelizmente, a felicidade dura pouco e Luke acaba sendo preso por agredir o noivo de Romina durante uma discussão.
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Robin paga a fiança e Luke é liberado, já determinado a retomar os assaltos. Só que Robin recua e diz que não vai mais ajudá-lo, então ele compra uma moto nova depois que a sua é destruída por seu patrão e resolve agir sozinho. Dessa vez, as coisas não saem tão bem e durante a fuga ele é perseguido por carros da polícia. Bradley Cooper aparece todo jovial e de barba feita como o policial que o encurrala numa casa. Os dois trocam tiros e Luke morre ao cair da janela do andar de cima. Fim do primeiro ato.
No segundo ato somos introduzidos a Avery, o policial interpretado por Cooper, que se encontra no hospital recuperando-se do ferimento que sofreu na troca de tiros. Ele é interrogado por um detetive sobre como exatamente se deu a morte de Luke, e acaba mentindo ao afirmar que Luke atirou primeiro. Mas Avery é um bom moço e passa a ser atormentado por um sentimento de culpa, principalmente depois que descobre que Luke tinha, assim como ele, um filho de um ano. Mesmo festejado como herói por seus colegas de trabalho, ele mal consegue disfarçar a aflição que está sentindo.

Ray Liotta então aparece como um policial corrupto e ameaçador que resolve levar Avery até a casa de Romina, que é vasculhada até o dinheiro de um dos assaltos de Luke ser encontrado sob o colchão do berço de Jason (que chega a ser carregado no colo por Avery). Depois, Avery arrisca pedir uma promoção bastante ambiciosa ao seu chefe, mas acaba tendo seu pedido negado e, por conta de sua perna ferida, acaba servindo como vigilante na sala de evidências. Se sentindo mal pela situação na casa de Romina, ele tenta devolver o dinheiro a ela, que não aceita. Então ele tenta dar o dinheiro ao seu chefe, como qualquer policial honesto faria, mas o chefe está longe de ser um poço de integridade e conta tudo a Liotta.
Liotta, mais ameaçador do que nunca, pede que Avery o siga de carro até um local remoto, e no trajeto percebemos que se trata do lugar mencionado no título original do filme, o lugar atrás dos pinheiros. A sequência é de uma tensão crescente, e vai ficando cada vez mais escuro à medida que Avery se aproxima do destino. Pressentindo que algo ruim vai acontecer, ele entra em pânico e recua, arrancando à toda velocidade. Ele guarda o dinheiro na caixa do caso de Luke, onde encontra a foto tirada no passeio do sorvete, e depois arma um esquema para enquadrar o grupo de policiais corruptos liderados por Liotta. Sem encontrar grandes empecilhos, ele consegue juntar as provas necessárias e derrubar o grupo, virando mais uma vez herói nacional. E você sente que nesse ponto o filme deveria amarrar as pontas e chegar a uma conclusão, mas não: ainda faltam 50 MINUTOS.
Chegamos finalmente ao terceiro ato, que é o que supostamente deveria trazer o statement que o filme parece tanto querer fazer. Passam-se quinze anos, e Avery agora é candidato a procurador-geral. Nenhum truque foi usado pra fazer Bradley Cooper parecer mais velho, e até seus cabelos brancos na nuca continuam os mesmos de quinze anos atrás, quando o personagem deveria estar ainda na casa dos vinte. Rose Byrne, que interpreta a esposa (agora ex), também não muda nada. Mas o foco mesmo aqui é o irritante AJ, o filho de Avery, que é interpretado por Emory Cohen. Ele chega pra morar com o pai, e fica logo claro que os dois têm uma relação difícil. AJ é o típico filhinho-de-papai mimado que acha que pode tudo, e ao chegar na nova escola, adivinha quem é a primeira pessoa com quem ele faz amizade... JASON! Sim, o filho de Luke. Bem inexplicavelmente, porque os dois não têm absolutamente nada a ver.
Mesmo assim, AJ e Jason começam a andar juntos, e chega a ser quase inevitável imaginar que existe alguma tensão sexual entre os dois. Do mesmo nada que surge a improvável amizade, surge também um carro da polícia pra prender os dois por posse de drogas, e aí você tem certeza que o filme está esgotado de ideias no que diz respeito à verossimilhança dos acontecimentos. Mas enfim, o que importa é que agora os personagens todos se encontram e descobrem quem é quem. Jason descobre que o pai de AJ foi o responsável pela morte de seu pai, e a coisa toda culmina com ele apontando uma arma pra Avery no mesmo lugar lá atrás dos pinheiros. O que vem a seguir não é muito emocionante.
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Uma pena. O filme constrói lentamente algo que parece ir numa direção, mas acaba indo em outra e no final não chega a lugar algum. Os dois primeiros atos são bastante envolventes e pacientemente desenvolvidos, e há toda uma atenção especial dedicada aos pequenos detalhes e conexões entre as histórias. Sem falar das excelentes atuações de Ryan Gosling e Bradley Cooper. Mas quando chegamos ao último terço, a coisa se perde e fica absurdamente arrastada, e no fim das contas eu não consegui captar qual foi a grande mensagem. “Não podemos fugir do nosso destino”? “Você colhe o que planta”? “O ser humano é naturalmente corrupto”? “Use camisinha”? Façam suas apostas. Mas seja lá qual for essa tal mensagem, o tempo total gasto pra se chegar nela é infinitamente menos proveitoso que somente os primeiros 50 minutos do filme, por exemplo, que pelo menos conseguem divertir e prender a atenção sem maiores compromissos.
Não que não dê pra tirar alguma coisa do filme como um todo. Há sim conexões entre as histórias, e é possível fazer algumas observações interessantes acerca dos personagens. Por exemplo, Avery passou tantos anos sendo consumido por um sentimento de culpa em relação ao estrago que causou na família de outra pessoa que se esqueceu de prestar atenção à sua própria, algo que é refletido no relacionamento distante e difícil que tem com AJ. Ele também subiu na vida denunciando a corrupção dos outros, sendo que na verdade foi sua própria corrupção ao mentir que acabou desencadeando todos os seus problemas. São pontos válidos. Por outro lado, o filme investe em outros pontos que parecem não ter a menor relevância, e às vezes nenhum sentido, como a amizade entre AJ e Jason. E o mais problemático em relação a esse ponto específico é que ele é claramente um mecanismo pra se chegar a uma conclusão supostamente inescapável e obrigatória, e no fim acaba não tendo função alguma quando a conclusão não se mostra nem uma coisa nem outra. E o lugar onde tudo termina acaba se tornando o lugar onde nada acontece.
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