
Título original: Mama
Ano: 2013 Direção: Andrés Muschietti País: Espanha / Canadá Duração: 100 min Elenco: Jessica Chastain, Nikolaj Coster-Waldau, Megan Charpentier, Isabelle Nélisse |
Avaliação:![]() |
Casal adota duas meninas selvagens que vêm com fantasma assassino a tiracolo.
Crítica:
E depois de muita enrolação eu finalmente resolvi ver este que é considerado por muitos um dos melhores filmes de terror dos últimos tempos, além de ser um dos maiores sucessos de bilheteria do gênero em 2013. Nada surpreendente, já que o nome de Guillermo del Toro envolvido costuma conferir certa credibilidade, indicando que se trata de algo acima da média pra boa parte do público. Eu, por outro lado, costumo ser bem mais cético em relação ao cineasta mexicano, especialmente quando o filme em questão faz parte da série “Guillermo del Toro apresenta”. É o caso de Mama, que, escrito e dirigido por Andrés Muschietti, faz jus ao preconceito pessimista de que quando o nome do produtor executivo famoso ganha bem mais destaque na divulgação que o do próprio cineasta responsável é sinal de que estamos lidando com um produto inferior. E põe inferior nisso.
Tendo lido diversos comentários positivos sobre Mama desde que foi lançado, inclusive da crítica especializada, eu esperava uma produção no mínimo correta que, mesmo não trazendo nada de novo, entretivesse de forma competente. Quando o filme terminou, veio aquele momento de reflexão profunda em que eu comecei a me perguntar se o problema era comigo ou se as pessoas tinham perdido a noção de vez, ou ainda se o filme que eu tinha acabado de assistir era o mesmo que tem recebido tantos elogios. Afinal de contas, não acho que já tenhamos chegado a um nível baixo a ponto de um embuste como Mama ser considerado um oásis no cenário atual. Mas enfim, espero compreender melhor esse fenômeno enquanto escrevo. Vamos ao enredo.
O filme é introduzido por um “Era uma vez...”, deixando claro que estamos prestes a ver uma espécie de conto de fadas e que, consequentemente, podemos esperar um final feliz. Então ouvimos em off um locutor de rádio falar sobre uma grave crise econômica que está assolando o país, enquanto um executivo chamado Jeffrey (Nikolaj Coster-Waldau), depois de matar seus colegas de trabalho e sua esposa, se prepara para fugir com suas duas filhas pequenas, Victoria e Lilly. Ele dirige sem rumo por uma região montanhosa e coberta de neve, e a sequência é belamente fotografada, com várias tomadas incríveis da paisagem. Mas aí Jeffrey perde o controle e o carro capota montanha abaixo, indo parar no meio de uma floresta. Os três sobrevivem e andam até encontrarem uma cabana abandonada, e lá o pai surta e começa a chorar descontroladamente, finalmente decidindo matar as duas filhas. O que um dia ruim no trabalho não faz, não é mesmo? Felizmente, antes de ele conseguir atirar na cabeça de Victoria, uma criatura cabeluda e flutuante o agarra e o mata, e daí em diante as meninas seguem sozinhas na cabana, acompanhadas da misteriosa entidade.
Passam-se cinco anos e o gêmeo de Jeffrey, Lucas, continua empenhado nas buscas pelo irmão e pelas sobrinhas. Jessica Chastain aparece fantasiada de Joan Jett como Annabel, a namorada de Lucas, uma garota tatuada cheia de atitude que toca numa banda punk e que não quer ter filhos tão cedo, como fica bem claro numa cena nada sutil em que ela faz um teste de gravidez. Então, numa checagem de rotina, os dois homens contratados por Lucas finalmente encontram a cabana na floresta, e lá dentro dão de cara com Victoria e Lilly, que agora são duas criaturas selvagens que, além de sujas e severamente desnutridas, andam como chimpanzés (e têm os dedos absurdamente alongados). Lucas e Annabel vão encontrar as meninas na instituição pra onde foram levadas e são informados pelo psiquiatra sósia de Tony Shalhoub, o Dr. Dreyfuss, que Victoria, por ser mais velha, conseguiu preservar um pouco do vocabulário e das habilidades sociais. Lilly, por outro lado, é completamente bestial. Quando vemos as duas na instituição, elas têm uma aparência completamente diferente da que apresentaram na cena da cabana: além de terem tomado banho, elas não são mais desnutridas, não têm mais os dedos longos e nem o caminhar frenético de computação gráfica. E tudo isso conseguido em apenas dez dias de internação!
Tem início uma batalha judicial com Lucas disputando a custódia das meninas com a rica e supostamente malvada e insensível tia Jean, irmã da mãe das garotas. Aqui o filme lança duas questões importantes que nunca responde: a primeira é por que Lucas faz tanta questão de ficar com as sobrinhas, e a segunda é por que somos levados a encarar tia Jean como a vilã da história, já que ela parece estar tão interessada no bem-estar das meninas como Lucas. Finalmente, o Dr. Dreyfuss decide que as meninas devem ficar com Lucas e Annabel, com a condição de eles se mudarem pra um casarão de propriedade da instituição, sob a justificativa de que se trata de um local para observação. Mas a verdade é que o muquifo onde o casal vive não é um cenário muito interessante pra um filme de terror mesmo. Também ficamos sabendo que durante o tempo na floresta as meninas criaram uma entidade imaginária que chamam de Mama, uma espécie de figura materna, que obviamente é a criatura do começo do filme.
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Annabel, nossa garota independente e durona, decide largar tudo em nome do amor e se mudar pra nova casa. Assim que a nova família se instala no casarão, eventos estranhos começam a acontecer e fica evidente que Mama também está no local, com sua presença se manifestando principalmente através de problemas elétricos e aparições de mariposas de CGI. Uma noite Annabel vê uma silhueta estranha no corredor e Lucas vai investigar, o que o leva a um encontro fatal com Mama, que o empurra violentamente escada abaixo. Ele vai parar no hospital e logo vira um personagem inútil, forçando Annabel a lidar sozinha com a situação. Enquanto isso, o Dr. Dreyfuss começa a investigar as origens Mama e acaba conhecendo a história de uma paciente de um extinto hospital psiquiátrico do século XIX que roubou um bebê e fugiu com ele pela floresta. Numa cena particularmente hilária, o Dr. Dreyfuss tem contato com a sabedoria anciã ao conversar com uma arquivista de mais idade que do nada vira uma especialista em fantasmas e entrega a ele uma caixa com os “erros” da paciente fugitiva, daquele jeito bem emocionado, quase sensitivo. Sutileza definitivamente não é uma das qualidades do filme.
No casarão, Annabel inevitavelmente fica mais próxima das meninas, afinal ela não tem muita escolha. No entanto, o filme quer passar a ideia de que um amor materno está sendo desenvolvido, e que por trás do orgulho e da aparência de durona, Annabel é sensível e protetora. Vale lembrar que poucos dias atrás ela nem considerou a hipótese ficar sozinha com as meninas depois do incidente com Lucas, aceitando a ideia por aconselhamento do Dr. Dreyfuss. Há então mais um confronto entre nossa heroína e tia Jean, que também se revela outra personagem inútil, jamais tendo seus atributos vilanescos de bruaca frígida explorados em favor de um conflito mais substancial. Dr. Dreyfuss segue nas investigações sobre o antigo hospital psiquiátrico e as origens de Mama, mas nunca ficamos sabendo exatamente o que ele descobre, apenas que se trata de algo muito, muito aterrorizante. Annabel tem um sonho que revela o que aconteceu com Mama através do ponto de vista da própria, mas a sequência mostra basicamente o que já havia sido dito antes, sem explicar as circunstâncias. Em câmera subjetiva (e com um filtro tosco de relevo na imagem), acompanhamos a paciente, que sofria de uma deformação física, tirar um bebê dos braços de uma freira, sair correndo pela floresta e se jogar de um penhasco com o bebê no colo. Só que ela cai no lago e o bebê fica preso num galho, também sendo morto pelo impacto. Aparentemente, para o filme, esse insignificante insight é o suficiente para considerar a história de Mama contada.
Blá blá blá, Dr. Dreyfuss vai até a cabana e morre como era previsto, Annabel e as meninas criam laços mais estreitos e Victoria fica cada vez mais preocupada com as demonstrações de carinho entre as duas e a mãe adotiva, o que pode provocar uma violenta crise de ciúmes em Mama. As aparições de Mama, aliás, ficam mais frequentes, e parece ser uma tendência em filmes de terror de anos recentes retratar fantasmas e seres demoníacos como figuras contorcidas que andam desajeitadamente, com os membros retorcidos e virados ao contrário, como uma imagem muito, muito aterrorizante. E meio que é mesmo, mas no caso de Mama é tudo tão cartunesco e carregado no CGI que fica impossível sentir o efeito desejado, que seria de medo e repulsa. Mas enfim, preocupada com o desaparecimento do Dr. Dreyfuss, Annabel surrupia todo o material de pesquisa do consultório dele, enquanto Lucas, depois de ter uma visão do irmão em um túnel, consegue fugir do hospital sem ninguém perceber, aluga um carro e segue em direção ao túnel da visão! Tia Jean chega ao casarão pra coletar provas de que as meninas estão sendo abusadas, mas logo é atacada pelo espírito de Mama, que possui o seu corpo pra poder conduzir as meninas até a cabana (note que o corpo de tia Jean é facilmente descartado mais adiante, já que Mama mostra conseguir agir fisicamente no mundo real sem qualquer suporte de carne e osso).
Annabel pega os restos mortais do bebê, sai dirigindo rumo à floresta e encontra Lucas no caminho. Os dois encontram Victoria e Lilly no penhasco acompanhadas do fantasma de Mama, e um confronto tem início. Mama tenta atrair Lilly pra se jogar do penhasco, mas Lucas a impede. Mama tenta imobilizá-lo com sua mão paralisante, mas Annabel saca sua trouxa com o cadáver do bebê e o entrega a Mama, que por um momento parece muito comovida. Mas quando ela vê que o bebê não passa de um monte de ossos, ela começa a chorar, e vemos o espectro dela com a aparência que tinha quando era viva. É pra ser um momento bem comovente, e tal, em que supostamente devemos sentir pena de Mama e de seu sofrimento. Mas aí ela se revolta de novo e captura Lilly, que por ser mais nova, realmente a ama sem reservas, e se mostra feliz e satisfeita em estar em seus braços. Victoria, por outro lado, agora prefere Annabel, e no fim Mama deixa que a mais velha fique e leva somente Lilly, que agora viverá por toda a eternidade no além, em forma de mariposa. Victoria, Annabel e Lucas (que parecia ter morrido depois de ter seu peito penetrado pela mão de Mama) agora podem formar uma família e viver felizes para sempre.
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Ok, por onde começar? Vejamos primeiro o que o filme tem de bom. A fotografia é ótima, temos performances relativamente boas do elenco, simbologias interessantes (como a coisa toda com os óculos de Victoria) e uma ou outra cena inspirada aqui e ali, como o ótimo plano em que vemos Lilly no quarto brincando de cabo de guerra com um lençol achando que do outro lado está Victoria, até que Victoria aparece em outro lugar e nos damos conta de que é Mama quem está puxando o lençol do outro lado. O que já nos leva direto aos defeitos da produção, já que a cena é exibida comprometida pela aparição anterior de Mama, já não provocando a mesma sensação de mistério em relação à figura. E cá pra nós, Mama passa longe de ser aterrorizante. Quase que completamente gerada por CGI, sua aparência ridícula, exagerada e deslocada de qualquer concretude só consegue encontrar suporte nas dezenas de sustos baratos que sempre vêm acompanhados de barulhos absurdamente altos. E, como não poderia deixar de ser, todos esses sustos são previsíveis. Temos os silêncios que obviamente serão logo quebrados, personagens acordando de pesadelos, flashes de câmeras fotográficas no escuro que mais cedo ou mais tarde revelarão uma presença macabra, e por aí vai.
Mas o problema maior mesmo reside no roteiro. Não por causa dos inúmeros clichês, dos quais a trama de Mama está repleta até o último fio de cabelo espectral, mas sim das inconsistências da história que chegam a ser quase ofensivas. Pra começar, não há a menor preocupação em estabelecer um arco dramático minimamente sólido com nenhum dos personagens. A motivação do pai das garotas no início para não só abandoná-las, mas também matá-las, soa banal e preguiçosa, e confesso que durante o filme esperei que fossem reveladas razões mais profundas e perturbadoras para que ele cometesse todos aqueles atos. A transformação pela qual Annabel passa é extremamente forçada e artificial, e em vez de dar a ideia de que está sendo desenvolvido um então desconhecido instinto materno, parece que ela está sofrendo de síndrome de Estocolmo, refém da presença desconfortável das duas meninas. E, mais grave ainda, acabamos não sabendo exatamente qual a história de Mama, apenas temos um vislumbre dos últimos momentos dela em vida sem nenhum tipo de contextualização. Chega a ser inacreditável que o filme tente despertar no fim um sentimento de piedade em relação à personagem e suas motivações, já que não oferece embasamento algum para tal. Fora que a situação toda não tem a menor lógica. Aliás, a cena final é tão ridícula que parece ter sido inspirada na do episódio final de Pesadelos Diabólicos (aquele do rato gigante).
Há também os personagens e subtramas que jamais são explorados de forma satisfatória. Lucas é descartado antes da metade do filme, o Dr. Dreyfuss e suas investigações são postos em segundo plano e tia Jean acaba tendo uma participação mínima no desenrolar da história. Resta Jessica Chastain pra assumir a função de heroína clássica, mas ela acaba também não tendo muito o que fazer.
No mais, ficamos com um filme de quase zero densidade dramática, com uma trama desconjuntada e cheia de elementos mal resolvidos, e que se apoia essencialmente nos efeitos visuais e nos sustos fáceis, explorados sem moderação. Uma pena, porque no fundo, bem lá fundo, é uma trama que, apesar de ordinária, poderia gerar um filme ao menos decente. E em mãos mais competentes, a experiência poderia ter sido muito, muito aterrorizante. O fato é que neste momento, depois de fazer essa revisão toda, continuo me perguntando como um filme tão cheio de falhas conseguiu arrancar tantos elogios do público e da crítica. E começo a pensar que, como Victoria, eu talvez precise de óculos pra conseguir enxergar as qualidades dessa bagunça chamada Mama.
Tendo lido diversos comentários positivos sobre Mama desde que foi lançado, inclusive da crítica especializada, eu esperava uma produção no mínimo correta que, mesmo não trazendo nada de novo, entretivesse de forma competente. Quando o filme terminou, veio aquele momento de reflexão profunda em que eu comecei a me perguntar se o problema era comigo ou se as pessoas tinham perdido a noção de vez, ou ainda se o filme que eu tinha acabado de assistir era o mesmo que tem recebido tantos elogios. Afinal de contas, não acho que já tenhamos chegado a um nível baixo a ponto de um embuste como Mama ser considerado um oásis no cenário atual. Mas enfim, espero compreender melhor esse fenômeno enquanto escrevo. Vamos ao enredo.
O filme é introduzido por um “Era uma vez...”, deixando claro que estamos prestes a ver uma espécie de conto de fadas e que, consequentemente, podemos esperar um final feliz. Então ouvimos em off um locutor de rádio falar sobre uma grave crise econômica que está assolando o país, enquanto um executivo chamado Jeffrey (Nikolaj Coster-Waldau), depois de matar seus colegas de trabalho e sua esposa, se prepara para fugir com suas duas filhas pequenas, Victoria e Lilly. Ele dirige sem rumo por uma região montanhosa e coberta de neve, e a sequência é belamente fotografada, com várias tomadas incríveis da paisagem. Mas aí Jeffrey perde o controle e o carro capota montanha abaixo, indo parar no meio de uma floresta. Os três sobrevivem e andam até encontrarem uma cabana abandonada, e lá o pai surta e começa a chorar descontroladamente, finalmente decidindo matar as duas filhas. O que um dia ruim no trabalho não faz, não é mesmo? Felizmente, antes de ele conseguir atirar na cabeça de Victoria, uma criatura cabeluda e flutuante o agarra e o mata, e daí em diante as meninas seguem sozinhas na cabana, acompanhadas da misteriosa entidade.
Passam-se cinco anos e o gêmeo de Jeffrey, Lucas, continua empenhado nas buscas pelo irmão e pelas sobrinhas. Jessica Chastain aparece fantasiada de Joan Jett como Annabel, a namorada de Lucas, uma garota tatuada cheia de atitude que toca numa banda punk e que não quer ter filhos tão cedo, como fica bem claro numa cena nada sutil em que ela faz um teste de gravidez. Então, numa checagem de rotina, os dois homens contratados por Lucas finalmente encontram a cabana na floresta, e lá dentro dão de cara com Victoria e Lilly, que agora são duas criaturas selvagens que, além de sujas e severamente desnutridas, andam como chimpanzés (e têm os dedos absurdamente alongados). Lucas e Annabel vão encontrar as meninas na instituição pra onde foram levadas e são informados pelo psiquiatra sósia de Tony Shalhoub, o Dr. Dreyfuss, que Victoria, por ser mais velha, conseguiu preservar um pouco do vocabulário e das habilidades sociais. Lilly, por outro lado, é completamente bestial. Quando vemos as duas na instituição, elas têm uma aparência completamente diferente da que apresentaram na cena da cabana: além de terem tomado banho, elas não são mais desnutridas, não têm mais os dedos longos e nem o caminhar frenético de computação gráfica. E tudo isso conseguido em apenas dez dias de internação!
Tem início uma batalha judicial com Lucas disputando a custódia das meninas com a rica e supostamente malvada e insensível tia Jean, irmã da mãe das garotas. Aqui o filme lança duas questões importantes que nunca responde: a primeira é por que Lucas faz tanta questão de ficar com as sobrinhas, e a segunda é por que somos levados a encarar tia Jean como a vilã da história, já que ela parece estar tão interessada no bem-estar das meninas como Lucas. Finalmente, o Dr. Dreyfuss decide que as meninas devem ficar com Lucas e Annabel, com a condição de eles se mudarem pra um casarão de propriedade da instituição, sob a justificativa de que se trata de um local para observação. Mas a verdade é que o muquifo onde o casal vive não é um cenário muito interessante pra um filme de terror mesmo. Também ficamos sabendo que durante o tempo na floresta as meninas criaram uma entidade imaginária que chamam de Mama, uma espécie de figura materna, que obviamente é a criatura do começo do filme.
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Annabel, nossa garota independente e durona, decide largar tudo em nome do amor e se mudar pra nova casa. Assim que a nova família se instala no casarão, eventos estranhos começam a acontecer e fica evidente que Mama também está no local, com sua presença se manifestando principalmente através de problemas elétricos e aparições de mariposas de CGI. Uma noite Annabel vê uma silhueta estranha no corredor e Lucas vai investigar, o que o leva a um encontro fatal com Mama, que o empurra violentamente escada abaixo. Ele vai parar no hospital e logo vira um personagem inútil, forçando Annabel a lidar sozinha com a situação. Enquanto isso, o Dr. Dreyfuss começa a investigar as origens Mama e acaba conhecendo a história de uma paciente de um extinto hospital psiquiátrico do século XIX que roubou um bebê e fugiu com ele pela floresta. Numa cena particularmente hilária, o Dr. Dreyfuss tem contato com a sabedoria anciã ao conversar com uma arquivista de mais idade que do nada vira uma especialista em fantasmas e entrega a ele uma caixa com os “erros” da paciente fugitiva, daquele jeito bem emocionado, quase sensitivo. Sutileza definitivamente não é uma das qualidades do filme.
No casarão, Annabel inevitavelmente fica mais próxima das meninas, afinal ela não tem muita escolha. No entanto, o filme quer passar a ideia de que um amor materno está sendo desenvolvido, e que por trás do orgulho e da aparência de durona, Annabel é sensível e protetora. Vale lembrar que poucos dias atrás ela nem considerou a hipótese ficar sozinha com as meninas depois do incidente com Lucas, aceitando a ideia por aconselhamento do Dr. Dreyfuss. Há então mais um confronto entre nossa heroína e tia Jean, que também se revela outra personagem inútil, jamais tendo seus atributos vilanescos de bruaca frígida explorados em favor de um conflito mais substancial. Dr. Dreyfuss segue nas investigações sobre o antigo hospital psiquiátrico e as origens de Mama, mas nunca ficamos sabendo exatamente o que ele descobre, apenas que se trata de algo muito, muito aterrorizante. Annabel tem um sonho que revela o que aconteceu com Mama através do ponto de vista da própria, mas a sequência mostra basicamente o que já havia sido dito antes, sem explicar as circunstâncias. Em câmera subjetiva (e com um filtro tosco de relevo na imagem), acompanhamos a paciente, que sofria de uma deformação física, tirar um bebê dos braços de uma freira, sair correndo pela floresta e se jogar de um penhasco com o bebê no colo. Só que ela cai no lago e o bebê fica preso num galho, também sendo morto pelo impacto. Aparentemente, para o filme, esse insignificante insight é o suficiente para considerar a história de Mama contada.
Blá blá blá, Dr. Dreyfuss vai até a cabana e morre como era previsto, Annabel e as meninas criam laços mais estreitos e Victoria fica cada vez mais preocupada com as demonstrações de carinho entre as duas e a mãe adotiva, o que pode provocar uma violenta crise de ciúmes em Mama. As aparições de Mama, aliás, ficam mais frequentes, e parece ser uma tendência em filmes de terror de anos recentes retratar fantasmas e seres demoníacos como figuras contorcidas que andam desajeitadamente, com os membros retorcidos e virados ao contrário, como uma imagem muito, muito aterrorizante. E meio que é mesmo, mas no caso de Mama é tudo tão cartunesco e carregado no CGI que fica impossível sentir o efeito desejado, que seria de medo e repulsa. Mas enfim, preocupada com o desaparecimento do Dr. Dreyfuss, Annabel surrupia todo o material de pesquisa do consultório dele, enquanto Lucas, depois de ter uma visão do irmão em um túnel, consegue fugir do hospital sem ninguém perceber, aluga um carro e segue em direção ao túnel da visão! Tia Jean chega ao casarão pra coletar provas de que as meninas estão sendo abusadas, mas logo é atacada pelo espírito de Mama, que possui o seu corpo pra poder conduzir as meninas até a cabana (note que o corpo de tia Jean é facilmente descartado mais adiante, já que Mama mostra conseguir agir fisicamente no mundo real sem qualquer suporte de carne e osso).

Annabel pega os restos mortais do bebê, sai dirigindo rumo à floresta e encontra Lucas no caminho. Os dois encontram Victoria e Lilly no penhasco acompanhadas do fantasma de Mama, e um confronto tem início. Mama tenta atrair Lilly pra se jogar do penhasco, mas Lucas a impede. Mama tenta imobilizá-lo com sua mão paralisante, mas Annabel saca sua trouxa com o cadáver do bebê e o entrega a Mama, que por um momento parece muito comovida. Mas quando ela vê que o bebê não passa de um monte de ossos, ela começa a chorar, e vemos o espectro dela com a aparência que tinha quando era viva. É pra ser um momento bem comovente, e tal, em que supostamente devemos sentir pena de Mama e de seu sofrimento. Mas aí ela se revolta de novo e captura Lilly, que por ser mais nova, realmente a ama sem reservas, e se mostra feliz e satisfeita em estar em seus braços. Victoria, por outro lado, agora prefere Annabel, e no fim Mama deixa que a mais velha fique e leva somente Lilly, que agora viverá por toda a eternidade no além, em forma de mariposa. Victoria, Annabel e Lucas (que parecia ter morrido depois de ter seu peito penetrado pela mão de Mama) agora podem formar uma família e viver felizes para sempre.
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Ok, por onde começar? Vejamos primeiro o que o filme tem de bom. A fotografia é ótima, temos performances relativamente boas do elenco, simbologias interessantes (como a coisa toda com os óculos de Victoria) e uma ou outra cena inspirada aqui e ali, como o ótimo plano em que vemos Lilly no quarto brincando de cabo de guerra com um lençol achando que do outro lado está Victoria, até que Victoria aparece em outro lugar e nos damos conta de que é Mama quem está puxando o lençol do outro lado. O que já nos leva direto aos defeitos da produção, já que a cena é exibida comprometida pela aparição anterior de Mama, já não provocando a mesma sensação de mistério em relação à figura. E cá pra nós, Mama passa longe de ser aterrorizante. Quase que completamente gerada por CGI, sua aparência ridícula, exagerada e deslocada de qualquer concretude só consegue encontrar suporte nas dezenas de sustos baratos que sempre vêm acompanhados de barulhos absurdamente altos. E, como não poderia deixar de ser, todos esses sustos são previsíveis. Temos os silêncios que obviamente serão logo quebrados, personagens acordando de pesadelos, flashes de câmeras fotográficas no escuro que mais cedo ou mais tarde revelarão uma presença macabra, e por aí vai.
Mas o problema maior mesmo reside no roteiro. Não por causa dos inúmeros clichês, dos quais a trama de Mama está repleta até o último fio de cabelo espectral, mas sim das inconsistências da história que chegam a ser quase ofensivas. Pra começar, não há a menor preocupação em estabelecer um arco dramático minimamente sólido com nenhum dos personagens. A motivação do pai das garotas no início para não só abandoná-las, mas também matá-las, soa banal e preguiçosa, e confesso que durante o filme esperei que fossem reveladas razões mais profundas e perturbadoras para que ele cometesse todos aqueles atos. A transformação pela qual Annabel passa é extremamente forçada e artificial, e em vez de dar a ideia de que está sendo desenvolvido um então desconhecido instinto materno, parece que ela está sofrendo de síndrome de Estocolmo, refém da presença desconfortável das duas meninas. E, mais grave ainda, acabamos não sabendo exatamente qual a história de Mama, apenas temos um vislumbre dos últimos momentos dela em vida sem nenhum tipo de contextualização. Chega a ser inacreditável que o filme tente despertar no fim um sentimento de piedade em relação à personagem e suas motivações, já que não oferece embasamento algum para tal. Fora que a situação toda não tem a menor lógica. Aliás, a cena final é tão ridícula que parece ter sido inspirada na do episódio final de Pesadelos Diabólicos (aquele do rato gigante).
Há também os personagens e subtramas que jamais são explorados de forma satisfatória. Lucas é descartado antes da metade do filme, o Dr. Dreyfuss e suas investigações são postos em segundo plano e tia Jean acaba tendo uma participação mínima no desenrolar da história. Resta Jessica Chastain pra assumir a função de heroína clássica, mas ela acaba também não tendo muito o que fazer.
No mais, ficamos com um filme de quase zero densidade dramática, com uma trama desconjuntada e cheia de elementos mal resolvidos, e que se apoia essencialmente nos efeitos visuais e nos sustos fáceis, explorados sem moderação. Uma pena, porque no fundo, bem lá fundo, é uma trama que, apesar de ordinária, poderia gerar um filme ao menos decente. E em mãos mais competentes, a experiência poderia ter sido muito, muito aterrorizante. O fato é que neste momento, depois de fazer essa revisão toda, continuo me perguntando como um filme tão cheio de falhas conseguiu arrancar tantos elogios do público e da crítica. E começo a pensar que, como Victoria, eu talvez precise de óculos pra conseguir enxergar as qualidades dessa bagunça chamada Mama.
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